quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

(a)Manhã de Restauração?

«Restauração, s. f. (do Lat. restauratione). 1. Acção ou efeito de restaurar. 2. Reparação, restabelecimento. 3. Recuperação. 4. Acto de reaver a independência ou nacionalidade perdidas. 5. Polít. Reestabelecimento de antiga dinastia no trono que perdera.»
Conforme a Lexicoteca - Moderno Dicionário da Língua Portuguesa.

Para além de um ser vivo dotado de uma missão, conforme defendeu Leonardo Coimbra, Portugal é também um corpo místico, uma entidade metafísica intemporal, cujas manifestações se revelam no plano material de inimagináveis formas ou maneiras. Essencialmente espiritual, Portugal é um Mito povoado de mitos, uns mais próximos de uma dita realidade do que outros. 
A tendência positivista-materialista e decadentista emergente no seio das nossas comunidades a partir dos séculos XVIII e XIX procurou asfixiar e anular a vivência desses mitos, substituindo-os pela mentira degenerativa, responsável por parte decadência da Pátria, impedindo que esta se renovasse e auto-revitalizasse. Alguns porém foram impossíveis de apagar, dada a sua necessidade para a manutenção de regimes e ideais políticos, conforme podemos constatar no artigo de Sérgio Campos Matos intitulado Hispanofobia e nacionalismo – a Comissão 1º de Dezembro e a memória de 1640 (1861-1926), apresentado no XXIX Encontro da Associação Portuguesa de História Social e Económica, realizado no Porto em finais de 2009, onde vemos uma mesma data ou acontecimento, ser celebrada, tanto pela esquerda como pela direita política, conforme os interesses do momento. Ora, celebrar o 1.º de Dezembro significa celebrar um renascimento, um reacordar ou redespertar de Portugal, pelo que pela sua essência, está muito para lá do alcance de qualquer possível acto ou reivindicação política.
Não obstante essa dimensão meramente política que se procura dar desde as primeiras comemorações do 1.º de Dezembro, grande parte dos nossos historiadores e outros intelectuais incorrem por norma num erro crasso, passível da velha palmatória. Ora, conforme lembrava nas suas aulas de Direito Internacional Público, o Professor e ex-Ministro da Defesa e Ultramar Joaquim Moreira Silva Cunha, desde a sua fundação, Portugal jamais perdeu a sua independência, lembrando o facto da dinastia Filipina governar segundo o princípio um Rei duas Coroas. Os nefastos resultados políticos, sociais e económicos desse período são inequívocos, indesculpáveis, intoleráveis e inquestionáveis, não sendo obviamente um bom português todo aquele que de algum modo procura defender a integridade, valor ou direito governativo de qualquer um dos Filipes. Contudo, independência e soberania foi algo que nunca perdemos. Na realidade, muitos dos traços que hoje são apontados como marcas e traços de demarcação de poder e soberania, eram na altura respeitados durante a nossa malfadada dinastia estrangeirada, coisa que hoje não acontece. Tomemos alguns exemplos para ilustrar esta nossa afirmação: a língua  e armas portuguesas foram naquele tempo mantidas e salvaguardadas como oficiais nas nossas Instituições e contactos internacionais, hoje coloca-se a nossa língua sob a égide de um obscuro (des)acordo ortográfico que a desrespeita e descaracteriza, com a União Europeia chega-se mesmo a colocar em causa a língua portuguesa como idioma oficial daquela organização supranacional, tendo a nossa bandeira sido substituída por aquela da União Europeia; Portugal manteve durante o domínio filipino as suas fronteiras, continuou a cunhar moeda, as suas populações podiam decidir o que cultivar, hoje, perante essa impossibilidade, os resignados afirmam que essas são questões de pormenor.  
De facto, 1640 acontece apenas quando Gaspar de Guzmán y Pimentel Ribera Velasco e Tovar, conhecido  por Conde Duque de Olivares, encarregue de dirigir D. Filipe III de Portugal, um monarca inábil e fraco, decide fundir o reino de Portugal no conjunto das Espanhas, procurando-nos retirar aquilo que apenas a União Europeia haveria de conquistar séculos mais tarde. A diferença entre aquele tempo e os dias de hoje recai na fibra que constitui os portugueses, hoje um povo adormecido, perdido num denso nevoeiro que lhe impede de encontrar o Norte e defenestrar os actuais Miguéis de Vasconcelos e Cristovãos de Moura.
Desta forma, podemos concluir que, na realidade, ao invocarmos a Restauração no primeiro dia de cada mês de Dezembro, não estamos a celebrar um resgate da independência, pois esta, apesar de várias vezes ameaçada, jamais foi perdida - Portugal, Nação Invicta e Imortal. Restauração não implica também um regresso ao passadismo, pelo contrário, prospectiva um futuro. A cada 1.º de Dezembro devemos antes comemorar a vitória sobre o nosso abastardamento espiritual, transformando este dia numa celebração do Triunfo Português sobre o triunfo dos porcos.

Armas de D. João IV - o Restaurador.

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