«Se a produção provincial é habitualmente identificada com a oficina familiar de Coimbra dirigida, como se supõe, por Vicente Gil e seu filho Manuel Vicente (os convencionalmente chamados mestres do Sardoal), e encontra em Vasco Fernandes, na oficina de Viseu, o mais célebre representante, foi da oficina de Frei Carlos, sediada no Convento de Santa Maria do Espinheiro, que saiu uma vasta produção já visivelmente afastada, nos seus vectores caracterizadores, do círculo cosmopolita. É certo que a oficina de Évora, comparativamente às já referidas, se distancia em dois vectores decisivos: por um lado, pela formação flamenga do pintor que, permanecendo isolado, se define um pouco à margem do processo evolutivo da pintura portuguesa deste período.»
Dalila Rodrigues em História da Arte Portuguesa: A Pintura no período manuelino.
Ascensão de Frei Carlos (c. 1530). |
Ocorrendo este ano no dia de hoje, a celebração da Ascensão já praticamente não é vivida pela maioria dos cristãos, sendo contudo um importante momento no seu calendário litúrgico. Esta celebração possui uma profunda importância no processo da redenção, surgindo como um prólogo da Paixão de Cristo, caracterizado pela subida de Jesus ao Reino dos Céus, para se sentar à direita do Pai.
Procurando recuperar e lembrar esta velha tradição cristã, desde sempre celebrada em Portugal, resolvemos destacar a magnífica obra Ascensão de Frei Carlos, o famoso mestre português do séc. XVI. O seu traço constituiu um importante modelo para a profícua oficina de pintura localizada no Convento de Santa Maria do Espinheiro. Apesar de esteticamente ser bastante notório o seu afastamento de artistas mais eruditos, em virtude de um maior contacto destes com outras oficinas que os influenciaram, a qualidade pictórica que Frei Carlos nos legou é no mínimo notável e singularmente original.
A grande curiosidade patente na sua Ascensão baseia-se na curiosa forma como representa a subida de Jesus Cristo aos Céus. De forma a causar uma sensação de levitação, procurando iconograficamente representar a Ascensão, Frei Carlos pinta uma figura de Jesus Cristo constituída apenas pelos seus pés. Aos olhos de hoje esta solução gráfica poderá até causar algum humor, parecendo que Cristo foi raptado por um disco-voador, não conseguindo o fotógrafo de serviço captar o momento atempadamente. Porém, bastará pensarmos no carácter catequético desta obra de arte, tendo em conta a sua finalidade última, para de imediato nos apercebermos na genialidade do seu autor, capaz de transmitir de forma tão clara uma determinada mensagem litúrgica, destinada a um mundo maioritariamente não-letrado.
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