«É muito tentador arrumar Keil como um dos diletantes que viveram na roda cosmopolita dos últimos Braganças. Agarrada às aparências, esta classificação deixa escapar a personagem. (...)
Keil, porém, jamais se sentiu como um simples servidor da dinastia. Sentiu-se, muito intensamente, um cidadão no sentido antigo da palavra, devotado apenas à pátria.
Keil era filho de alemães. Lembrava-se de ouvir em casa o seu avô Stellpflug, que nunca conseguira aprender português (...) Falava e escrevia em francês ao pai, Johann Christian. Em 1876, tornou-se genro de um italiano, ao casar com Cleyde Cinatti, filha do arquitecto Giuseppe Cinatti. Mas a pátria foi, para Keil, sempre Portugal. Em 1869, a estudar em Nuremberga, suspirava melancolicamente: "Que saudades da minha pátria, do meu Tejo."»
Rui Ramos em O Cidadão Keil.
Alfredo Keil foi de facto um cidadão ímpar, digno de um carinhoso destaque na memória do povo português. A sua vida diluiu-se na extensa obra que nos legou, testemunhado parte da grandeza dos grandes mestres do génio português que viveram aqueles conturbados anos de finais do século XIX e inícios do século XX.
Sobretudo conhecido enquanto compositor, Alfredo Keil foi um artista e homem completo. Músico, compositor, coleccionista, fotografo, excelente pintor, Keil encarnou o verdadeiro sentido da estética romântica, associando os seus múltiplos talentos ao gosto pela cultura e ao arrebatador amor pela sua pátria, Portugal. Este sentimento revela-se não apenas na força que impôs às paisagens que pintou ou à sua composição musical mais famosa, A Portuguesa, nosso actual hino nacional, mas também pelo facto de ter composto a primeira ópera cantada em português, A Serrana, uma peça inspirada numa obra do incomparável Camilo Castelo Branco.
Não deixa se ser irónico que uma personalidade como a de Alfredo Keil seja tão pouco conhecida e celebrada no nosso país. A máxima de que o produto estrangeiro é melhor não podia uma vez mais estar tão errada, dada a qualidade superior das obras de Keil, reconhecidas e galardoadas internacionalmente, tanto ao nível da música, como da pintura. Causa-nos por isso alguma repulsa constatar que, por exemplo, em 2006, por altura dos 250 anos da morte de Mozart, até a mais pequena das freguesias celebrou a efeméride do compositor austríaco, num programa de celebrações que se estendeu até 2007, ano em que se assinalou os 100 anos do desaparecimento de Alfredo Keil. Estranhamente, ou talvez não, pouco ou nada se ouvir falar acerca de Alfredo Keil. As composições de Mozart inundavam as salas de espectáculo portuguesas, não havendo quem no seu reportório integrasse uma única música do compositor português que, goste-se ou não, foi bem mais preponderante e importante para Portugal do que Wolfgang Amadeus Mozart.
A extinta revista independente de música e cultura Elegy Ibérica, foi dos poucos representantes da imprensa a lembrar esta efeméride em 2007, com um artigo que aqui aproveitamos para reproduzir, num sinal de claro reconhecimento e sentida saudade por essa publicação periódica.
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