«Há quatro maneiras principais de foder, e vêm a ser: a foda a direito, ou a natural; a foda de lado; a foda por cima e a foda por detrás. Seja qual for a forma, a primeira condição para foder é da parte do homem ter tesão, da parte da mulher, o ser mulher, isto é, ter cono.»
Excerto de um texto anónimo do almanaque O Pauzinho do Matrimónio.
Capa da mais recente reedição do almanaque anónimo O Pauzinho do Matrimónio. |
Apesar do conhecido gosto que os autores portugueses sempre nutriram pelo humor, sátira, libertinagem e um certo erotismo de sabor porno-popular a roçar a boçalidade, nem sempre lhes foi possível desenvolverem livremente o seu exercício criativo. A questão dos costumes sempre foi bastante ambígua na sociedade portuguesa, não se podendo falar de uma crescente conquista na liberdade de criação longe dos olhares condenadores da censura, mas antes de diferentes períodos históricos caracterizados por mais ou menos abertura, tanto por parte da sociedade, como de instituições reguladoras e zeladores desses ditos costumes. Basta pensarmos em Gil Vicente ou no próprio Luís Vaz de Camões que, certamente, terão tido mais facilidade em abordar determinadas temáticas do que, por exemplo, Bocage, alguns séculos mais tarde.
Durante o séc. XIX persistiu-se numa tentativa de moralização institucional da sociedade, o que nem por isso desenfreou o imputo libertino dos nossos maiores. Verdade seja dita, o sexo sempre agradou aos portugueses. Atrever-nos-íamos mesmo a dizer que este quase nos agrada tanto como o próprio escândalo sexual, sendo a figura do "corno" altamente inspiradora, revelando-se um ingrediente obrigatório da nossa tão famigerada piada brejeira. Não obstante esta realidade transversal ao gosto das classes mais altas, assim como das mais baixas, grande parte dos autores preferiam por razões óbvias manter o seu anonimato, nascendo deste modo, na penumbra da semi-clandestinidade, obras como O Pauzinho do Matrimónio - Almanaque Perpétuo.
Esta obra surgiu no Portugal do séc. XIX, durante um período de crise em que o riso era uma importante arma para escapar à depressão em que a nossa sociedade se encontrava mergulhada. Como qualquer outro almanaque daquela época, O Pauzinho do Matrimónio incluía calendário, adágios, adivinhas, canções, contos, pequenos textos costumeiros e pseudocientíficos, distinguindo-se apenas das restantes publicações do género pela perenidade das matérias que versava. Com uma linguagem altamente crua e obscena, Rafael Bordalo Pinheiro associou-se anonimamente à sua publicação ilustrando, ao seu melhor estilo, esses brilhantes textos de vários autores incógnitos. O sucesso desta publicação foi grande, trazendo à tona a boa moralidade popular. Toda a gente criticava, mas toda a gente a lia e conhecia.
Este curioso almanaque foi recentemente reeditado pelas Edições Tinta-da-China, recuperando-se a memória desta importante obra do nosso séc. XIX, importantíssima para conhecermos um pouco melhor os caminhos traçados pela cultura popular e pelo humor português. De forma a deixarmos um pequeno cheirinho sobre o que encontrar e esperar de O Pauzinho do Matrimónio, resolvemos deixar algumas das suas ilustrações, criadas pelo grande Rafael Bordalo Pinheiro.
Ilustração de Rafael Bordalo Pinheiro referente à capa da primeira edição do célebre almanaque O Pauzinho do Matrimónio. |
Ilustração de Rafael Bordalo Pinheiro fazendo alusão a um curioso rifão popular. |
Ilustração caricatural da autoria de Rafael Bordalo Pinheiro. |
Outra ilustração de uma das muitas pequenas histórias incluídas no derradeiro almanaque. |
Fantástico!
ResponderEliminarDesconhecia por completo este segmento da obra de Bordalo.
Obrigado NCP.
NBJ