quinta-feira, 28 de abril de 2011

Mircea Eliade, Salazar e a Revolução em Portugal

«Grande manifestação popular em homenagem a Salazar. Com alguma dificuldade encontro um lugar na Praça do Comércio, uma hora e meia antes da hora marcada. (...)
Às seis aparece Salazar na varanda. Ruge toda a massa viva a seus pés. Com alguma dificuldade, debruçando-me bastante sobre a balaustrada consigo ver-lhe o perfil. Veste roupa simples, cinzenta, de passeio - e sorri saudando com a mão, comedidamente, sem gestos. Quando ele apareceu, do alto começaram a despejar cestos com pétalas de rosas, cor-de-rosa e amarelas. Observei, mais tarde, enquanto um jovem falava num palco no meio da praça, como Salazar brincava pensativo com algumas pétalas que tinham ficado na balaustrada. Depois vi-o falar. Lia com bastante calor, mas sem qualquer ênfase, levantando de quando em quando os olhos do papel e olhando a multidão. Levantava a mão esquerda, mole, pensativa. Uma voz nunca estridente. E, no fim da leitura, quando a praça o ovacionava, inclinava sorridente a cabeça. Parece que nem sentia a força colectiva esmagadora a seus pés. De qualquer modo não era prisioneiro dela, nem sequer se deixava sugestionar por ela.
»

Capa do recém publicado Salazar e a Revolução
em Portugal
.

Mircea Eliade foi um dos mais conceituados intelectuais do séc. XX, um homem dos mil saberes. Talvez por isso, tanto a obra como a sua própria vida apaixonam tanto os investigadores como os seus admiradores. Apesar de menos controverso do que outras personalidades como Martin Heidegger, Mircea Eliade é ainda hoje frequentemente criticado pela sua proximidade a regimes autoritários durante o período da II Guerra Mundial e aquele que lhe antecedeu. A confessa admiração pelo seu carismático compatriota Corneliu Zelea Codreanu, líder do Movimento Legionário romeno conhecido por Guarda de Ferro, bem como pelo ditador português, António de Oliveira Salazar, valeu-lhe alguns dissabores ao longo da vida. Contudo, o discernimento e superior inteligência do autor de obras como O Mito do Eterno retorno, Aspectos do Mito, Do Sagrado e do Profano ou Tratado da História das Religiões sobrepuseram-se às vozes da censura intelectual.
Chegando a Portugal a 10 de Fevereiro de 1941, Mircea Eliade desempenhava entre nós as funções de adido cultural da embaixada da Roménia em Lisboa. Vindo de Inglaterra, preocupava-lhe o turbilhão em que a Europa mergulhara, em particular a triste sorte da sua pátria, aparentemente abandonada, lá bem longe, às mãos dos que lutavam pelo controlo hegemónico do velho continente. Portugal figurava então, diante dos olhos do autor romeno, como um verdadeiro paraíso. Mais do que um país, mostrava-se um modelo capaz de escapar à II Grande Guerra, conquistando a sua neutralidade, mantendo-se independente nas suas convicções e paradigmas político-culturais, de costas voltadas ao comunismo e à pseudo-democracia dos restantes aliados, repudiando também o excessivo totalitarismo político-servil das forças do eixo.
Este é o Portugal dado a conhecer de forma apaixonante na obra Salazar e a Revolução em Portugal, da autoria de Mircea Eliade, sendo a personagem central António de Oliveira Salazar, último grande estadista português, cujo nascimento hoje celebrámos.

Sem comentários:

Enviar um comentário